O DEVER QUE NÃO NOS CHAMA
ou CADÊ A PARTE QUE ME CABE DESTE LATIFÚNDIO?
Construir uma Antologia, por mais hábil e capaz que uma pessoa seja, é uma das coisas mais complicadas e arriscadas que alguém, em são juízo, se presta a fazer em sua vida; principalmente, pelo fato de essa tarefa, irrefutavelmente, despertar a indignação de alguém, seja por não ver o seu trabalho ali publicado, ou, por não achar, nesta publicação, um trabalho do qual ele goste e considere digno de ali se fazer presente. Seria simples dizer: “quem quiser uma boa antologia, que a faça?” Claro que não...! Eu que tenho pretensões – e somente pretensões, até agora – de me arriscar a tal tarefa, sei muito bem deste problema.
Mas me parece que o professor e poeta Marco Lucchesi esqueceu-se um pouquinho disto em Roteiro da Poesia Brasileira: volume anos 2000 (Global, 2009), de sua autoria. Digo isso por causa do enorme estardalhaço que esta antologia causou – pelo menos, no espaço destinado aos comentários no Blog: http://leitoracritica.blogspot.com/, administrado pela autora Gerana Damulakis, aqui, da Bahia... de Salvador – fora isso, a antologia me parece que vai muito bem, obrigado! Gerana, que é autora, entre tantas coisas, da antologia Panorâmica do conto baiano, deveria, também, ficar temerosa, pois... nunca se sabe.
Pela qualidade de sua poesia, que conheço bem, e por seu trabalho como crítico, que muito pouco conheço, Marco Lucchesi é uma das pessoas mais capazes de construir uma antologia permeada de riqueza e de qualidade, mas como disse a pouco, quem o livrará de irrefutáveis indignações? Seu trabalho foi rechaçado por uma turba de leitores e autores indignados, e, a maioria com razão, de esta antologia não abarcar o real momento por que passa a produção literária baiana e se limitar a um grupo geograficamente e cooperativistamente incrustado em Salvador e pela mídia local.
Parece-me que a grande questão está na atuação destes poetas no círculo literário baiano, que, sem sombra de dúvidas, ou pelo menos em meu ver, é muito grande; é só conferir os cadernos culturais, os concursos literários, as raríssimas, mas existentes, entrevistas em rádio e TV, e veremos que há uma razão muito grande para que estes nomes se façam presentes; por isso, não vou, de forma alguma, atacar o trabalho de Lucchesi, nem os critérios pelos quais ele chegou a esta tão “famigerada” lista de autores baianos, mesmo que alguns desses, se quer, tenham nascido na Bahia – mas alguém aqui diria que Clarice Lispector é uma dignatária da literatura ucraniana? Vanessa Buffone, por exemplo, tem uma poesia leve e expressiva, e, retirando-se alguns lugares-comuns do feminismo literário, é a autora mais talentosa presente entre os “novos baianos”. Já no que diz respeito a outros ali presentes... é melhor deixar pra lá.
Dado aos círculos de amizades que se fazem entre muitos escritores, que criam, promovem, participam e premiam-se mutuamente, com a ajuda cooperativista que tanto banaliza a política e a maioria dos negócios em nosso país, e que não se faz diferente nos meios literários de todo o Brasil, entre Academia, Cadernos Culturais e tapinhas nos ombros, temo que Marco Lucchesi tenha sido vítima das aparências muito mais do que muitos leigos e desapercebidos que, sentados na poltrona de suas casas, de frente para algum programa sensacionalista de televisão ao meio-dia, dão tanta importância a assuntos ligados à Literatura quanto se dá a um mosquito que acabou de ser esmagado pelo jornal de ontem... aqueeeele que continha um certo caderninho, com uns poeminhas...?!
Pensando melhor... bem que Marco Lucchesi poderia ter dado uma olhadinha na Bahia para além de Salvador... ali, em Ilhéus, em Feira de Santana, em Cachoeira... Ele só não pode dizer que foi contagiado pela famosa “preguiçinha baiana”, pois, para alguém com tantos e merecidos títulos como Lucchesi, para um professor à altura de sua graduação e fama, faltou-lhe o elemento básico em sua antologia: uma boa, sincera e exaustiva pesquisa.
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E pior que o cooperativismo deliberado é o espírito cooperativista intrínseco, pelo que me parece existir no espírito sujo de muita gente, que, infelizmente, acha que uma pessoa que critica, por melhor e construtiva que seja a crítica, é uma invejosa e uma infeliz que não realizou seus sonhos e aspirações, e, mais interessante ainda, é se valer de críticas para criticar o uso da crítica propriamente dita... “faça-me uma garapa!”, como dizia o meu avô, esta não tem Freud que explique.
Digo isso, pois, dos muitos comentários que li o do poeta Gustavo Felicíssimo foi um dos melhores e mais coerentes, mas, por uma dessas ilógicas que só têm lógica nos meios literários brasileiros, e, conseqüentemente, no baiano, foi o mais atacado e acusado entre tantas coisas – até mesmo de fruto de uma inveja explícita e descabida... ai, minha carapuça!
Gustavo Felicíssimo, a quem aprendi facilmente a admirar como pessoa e como artista, e que já tive a oportunidade, aqui mesmo neste Blogger, de dizer estas mesmas coisas, é um defensor de idéias e filosofias e ver alguma inveja em seus comentários é o mesmo que enxergar a pedagogia de Piaget num programa da Xuxa. O que será de mim, então, após publicar este artigo? Miserere mei, Deus: secundum magnam misericordiam tuam...
Tão importante quanto o fato de defender uma idéia, e ainda mais uma filosofia, é vivê-la, é torná-la a essência de sua existência e nela construir uma vida singular, baseada naquilo que se tem como verdade ou missão, e, isso, cabe, também, e talvez mais (ou mais freqüentemente) aos poetas. É o caso, por exemplo, do Gustavo Felicíssimo, atualmente um dos melhores, mais promissores e ativos poetas da atual Literatura Baiana e Brasileira; atividade que vai além da poesia e se estende para um trabalho de divulgação das novas gerações poéticas e que, graças à qualidade tanto de sua poesia como de seu trabalho de crítico e de divulgador, tem sido reconhecido por muitos dos melhores poetas e críticos do país, a exemplo de Pedro Sette Câmara, Cláudia Cordeiro e Luis Dolhnikoff e, lógica e verdadeiramente, é atacado e invejado por uma leva considerável de nossos medíocres alguma-coisa.
Eu, particularmente, considero as micro-entrevistas da série Três perguntas para... (conferir: http://sopadepoesia.zip.net/), uma das idéias mais bem boladas da Internet e, mais particularmente ainda, um dos melhores projetos dos quais participei. O fato de se fazer presente em várias revistas e sites de poesia, como o Cronópios e, mais recentemente, Plataforma para a poesia, além de seu Blog, Sopa de poesia, ser reconhecidamente premiado, pela revista Veja, como um dos melhores Blogs do país, são exemplos concretos de que Gustavo Felicíssimo merece todos os elogios que, sem medo ou pudor, e, sim, com sinceridade e débito, venho prestar a ele nestas poucas e insuficientes palavras... Como podem ver, aceito a cruz que, deliberadamente, me adorna os ombros.
Se o Gustavo fez quaisquer comentários sobre seja lá o que for, ele deve ser julgado pela qualidade e veracidade dos comentários que fez e não porque, simplesmente, teve a coragem o dever e a capacidade lúcida e bem fundada de fazê-lo; e o mesmo vale para a antologia de Marco Lucchesi... o que ou quem se presta contra estas coisas, sim, é um invejoso ou um cooptado pela inveja.
...mas não é Freud que diz que dizia que “o instinto de amor em direção a um objeto exige um domínio para obtê-lo, e, se uma pessoa sente que não consegue controlar o objeto, ou se sente ameaçada por ela, passa a agir negativamente com relação a ele ...”?
Melhor deixar pra lá...
Feira de Santana, 28 de outubro de 2009
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