terça-feira, 12 de maio de 2009

UMA HOMENAGEM À SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN


A poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004)


A BALADA DE SOPHIA
ou A OBSCURA IMPACIÊNCIA
( UMA ELEGIA CRISTALINA EM MEMÓRIA

DE SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN )



Porque toda paixão anda pertodessa obscura impaciência...
BRUNO TOLENTINO

Sofia faz-refaz, e subindo ao cristal,em cristais ( os dela, de luz marinha ).
JOÃO CABRAL DE MELO NETO




( Se
ao menos em mim tua dissolução fosse incerta, não perderia teu nome nesses versos frios tão cheios de dúvidas, tão cheios de sombras. E a escuridão desceu incólume sobre o sangrar sem fim das tardes sólidas, e nos envolveu de imortal tristeza; e a escuridão se fez memória, e se reescreveu em papel e sopro, na tentativa vã de que a vida nos afirmasse de algum modo e com maior verdade.) Se ao menos em mim tua dissolução fosse incerta, talvez voltássemos a nós mesmos: Tu, à casa onde o possível se imaginara maior... Eu, aos abismos sucessivos que a dor abraça... e, em Nós, bem fundo, e mais urgente, o sono de todas as lembranças, ou das intermináveis despedidas; coisas que, um dia, d’outro lado de tudo, serão moldura do Perfeito...



Se
ao menos em mim, e somente em mim, se possível fosse, a tua dissolução nos parecesse incerta, Eu poderia ter de ti a contínua feitura do teu verso e de teu Ser agora elevado e não menos puro, a qual Cabral cantou com calma... com calma crua e sólida de cristal de luz marinha; o pernambucano duro, entretanto, em versos derramados de rochas fluidas nos enganara; assim, perdi teu Ser e tua Morte para esta Eternidade que incomoda, pois foste rasteira,... porém, não lineada – como ondas na praia escura – para a Noite de amanhãs que nascem inversas e os sonhos têm muito mais de mistério que de sonhos –, ondas em praia nua... que de tanto ir e vir de feitura em feitura tinhas tanto em ti de Silêncio e de mar quanto o que há em mim de areia e de Saudade, pois
de todos os cantos do mundo, amo
com um amor mais forte e mais profundo
aquela praia extasiada e nua
onde me uni ao mar, ao vento, à lua
e à tua lembrança, onde o perfeito é não quebrar aquela imaginária linhade teu rosto
que ainda procuro...



Mas,
se ao menos em mim tua dissolução parecesse
incerta, talvez tentasse aceitar,
com firmeza que não tenho,
no rosto,
as marcas do porvir
que trago agora,
que têm tudo de real,... que têm tudo de concreto.



Um comentário:

Patriota disse...

Uma grande poetisa, grande pela sua simplicidade, poemas claros como a água... aliás a poesia de Sophia era tão simples, que a mãe dela dizia-lhe: "A tua poesia é tão simples que ninguém a entende!"

uma excelente homenagem.


Foi bom recordar... =)
Obrigado!