Desta varanda, de Antônio Brasileiro Borges (P55 Edições, 2011 – Coleção: Cartas Bahianas) |
Antônio Brasileiro
Borges nasceu em Matas do Orobó, interior da Bahia, mas foi em Feira de Santana
e Salvador que exerceu a maior e mais importante fase de sua vida literária,
como professor, poeta e articulador cultural. É autor de vários livros de poesia,
entre os quais: Os três movimentos da
sonata (1980), Licornes no quintal,
(1989), Poemas reunidos (2005), Dedal de areia (2006)... entre outros.
Em seu novo livro, Desta varanda (P55
Edições, 2011 – Coleção: Cartas Bahianas),
Brasileiro nos mostra de maneira contundente porque é um dos maiores e mais
peculiares poetas do Brasil. O livro é um arremate tanto das leituras que faz
dos grandes mestres da literatura universal, como grande consumidor de poesia
que é (que vai de Sá de Miranda a Baudelaire ou de Camões a Alexei Bueno), bem
como de seu mundo pessoal e interior; (de homem do campo, professor, poeta,
pai, ser vivente...) Em seus versos, o passado e o presente fundem-se de uma
maneira única, e o mundo dos grandes clássicos da literatura alinhava-se ao das
cantigas de roça e dos aboios sertanejos, mas sem se perder aquele fio da
linguagem erudita que une e transforma tudo na expressão poética de um mestre
maior. Antônio Brasileiro Borges é força poética crua e Desta varanda, em seus pouco mais de 40 poemas, mostra-se-nos como
o resultado desta força poética em sua forma mais plena; é, sem sombra de dúvidas,
um dos maiores livros de poesia já lançados no Brasil; um livro que ninguém
menos que um poeta maior poderia conceber. Por isso, eu o recomendo...
LAGOS SEM MARGENS*
Esta de asas exangues já não corta
o céu da vida, eis que está
dormindo
nos veios esquecidos da memória.
E em veios da memória, esparzindo
um tempo que, em vãos de dor,
comporta
outra memória e outra e, assim,
fluindo
/escampos brancos da sutil
história
pássaros breves, animais balindo
lagos sem margens pontes levadiças
cavaleiros encantos várzeas aves
do sono, exangues asas, áureas
liças/
– ó
coisa todas vãs, todas mudaves! –
não fosse a instância prima do
existir
como seria bom, também, dormir.
***
OS BOIS DE OSSOS
A casa de meu pai era espaçosa,
nela cabiam todos os meus sonhos –
e fazendas, currais e os bois de
ossos
que o menino tocava na varanda.
Do quintal avistávamos o cosmos.
Ilusões não as tínhamos: à sombra
das mil estrelas nuas, eis que
nossos
confins mal abarcavam o horizonte:
até a Serra o mundo ia. E só.
Mas era este o mundo e este o
encanto.
A casa de meu pai tinha mil salas
e um menino. E seu olhar de
espanto.
Só tu, memória tola, não te calas.
***
SILS MARIA
O grande amor não quer amor: quer
mais.
Tudo que somos é cais tumultuoso.
*Os três poemas acima pertencem ao livro Desta Varanda, de Antônio Brasileiro...
*Os três poemas acima pertencem ao livro Desta Varanda, de Antônio Brasileiro...
Um comentário:
Gosto de alguns poemas de Brasileiro. Diria que 20% de sua obra me agrada. Mas me irrita muito a constante imitação de Drummond, a insistência na inutilidade da poesia, coisa que é dita desde Oscar Wilde, mas que Brasileiro transforma em filosofia jeca-zen, e me irrita ainda a tentativa de fazer filosofia heideggeriana barata... Alguns poemas curtos, como esse que vc postou na mensagem, Silvério, são, para mim, absolutamente impublicáveis. Essa mania de falar do pai, da infância. Puta que pariu, ô coisa chata! É uma pena, porque Brasileiro, quando acerta, acerta em cheio.
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