Combate de Centauros de Arnold Bocklin (1885), Óleo sobre tela, 80X155, Galeria Nacional de Berlin. |
COMBATE DE CENTAUROS:
ou CARTA ABERTA PARA ARNOLD BRÖCKLIN
Vocês já leram o artigo: Flipelô: desocupa, Inácio! que Henrique Wagner
publicou no Expoart: http://www.expoart.com.br...?
Não!? Então leiam:
Li recentemente uma nota de jornal que
falava de uma feira de Literatura no Pelourinho, a Flipelô – Feira Literária
Internacional do Pelourinho. O Minc autorizou a Fundação Casa de Jorge Amado a
captar 2.636.600 reais para a realização da festa em homenagem ao centenário de
nascimento do escritor baiano Jorge Amado (1912-2012). A princípio fiquei
contente. O Pelourinho, sofrido e andrajoso, seria resgatado em função da
feira, e haveria mais um encontro, além da Bienal, em torno do livro e da
Literatura. Entretanto, logo me veio a imagem do feirante José Inácio Vieira de
Melo, o alagoano que vem mandando na poesia baiana, participando e
“organizando” tudo quanto é feira em que haja poesia e poema no meio,
emprestando à Bahia um sotaque que não é nosso, um coronelismo que há algum
tempo tentamos deixar para trás, e um mau gosto de província que igualmente
nós, baianos, tentamos rechaçar, desde o tempo da corte.
É muito provável que todos que me
conheçam e que conheçam meu entrevero com o fogoso poeta alagoano, comecem a
pensar em uma questão pessoal. Há muitos argumentos que provam o contrário
desse pensamento e que defendem uma preocupação, minha, muito sincera, com os rumos
da poesia baiana oficializada pela mídia impressa, pelas tevês e pelos eventos
literários.
Inácio organiza, há alguns anos, um
espaço de apresentação de poetas na Bienal do Livro. Há alguns anos ele escolhe
de modo pessoalíssimo os participantes do evento. Não há critério de outra
natureza senão o critério da amizade, da filiação partidária – o partido do
Inácio é a poesia que ele faz – e do fisiologismo. Inácio conquistou certo
poder em Salvador porque é um homem de muito fôlego e sem a mínima vergonha
para fazer amigos e influenciar pessoas. Não por acaso tem uma alentada fortuna
crítica mesmo escrevendo as coisas que escreve. E como se trata de um rapaz com
uma necessidade patológica de mostrar serviço aos pais, à cidade onde nasceu, a
“seu povo” etc, faz e acontece para aparecer. O problema é que seu “método”
excludente de trabalho acaba comprometendo uma quantidade significativa de
poetas de todo o estado da Bahia. Não há honestidade cultural para separar a
pessoa da obra. Ele não consegue convidar pessoas que não gostem do que ele
escreve, por exemplo. E menos ainda pessoas que tenham discutido – e vencido a
discussão com palavras, apenas – com ele sobre tal ou qual assunto.
Vale agora um parêntese: eu não pretendo
participar da Flipelô. Não tenho nada a falar, não gosto de mesa-redonda com
escritores jovens, não gosto do formato, milenar, de uma mesa ou cadeira, com
um poeta falando de sua “vida e obra” aos 17 anos de idade, e lendo poemas.
Estou representando, neste texto, uma turma de poetas que não consegue espaço
porque o aboio livre de um alagoano, que se instalou na Bahia com truculência e
malícia, vem ocupando todos os cantos da cidade com sua poesia ruim e suas
limitações intelectivas, criando um cubismo sobre a realidade da poesia baiana,
e um cubismo a la Menelaw Sete, e não a laPicasso.
Pois bem. Além da falta de honestidade
cultural do poeta José Inácio Vieira de Melo, há ainda outros graves problemas.
Um deles diz respeito ao formato da chamada Praça do Cordel, ou à concepção de
seu funcionamento. Poesia é artigo de luxo e deve ser tratada como tal. Estive
na Praça do Cordel (reparem no nome da praça onde poetas se apresentam, e não
cordelistas, embora alguns lá se apresentem) apenas uma vez, na bienal mais
recente, e porque uma pessoa muito querida minha leria poemas para o público.
Desse modo é que testemunhei um dos acontecimentos mais vexatórios, mais
vergonhosos que jamais eu testemunhara no meio literário. A completa falta de
noção do organizador, a deselegância do apresentador ou mestre de cerimônias do
evento – Cleberton Santos –, e sobretudo a burrice mesmo do que eu ouvia por
parte desse apresentador. O espaço aberto não permitia que o público ouvisse um
poema sequer. Esse mesmo espaço aberto possibilitava a constante entrada e saída
de pessoas, comprometendo a atenção da plateia e mesmo a dos poetas que estavam
se apresentando. E há ainda a escolha dos participantes. Vê-se de tudo:
gritadores de poesia que mais parecem pedintes desesperados, sem dinheiro nem
para comprar um desodorante, garotos que publicaram dois ou três poemas numa
antologia organizada por Inácio, filhas de santo cuja poesia é uma recitação da
negritude e do candomblé, sem literatura que a sustente. Essa falta de
critério, ou esse critério defeituoso afasta o público neófito. Inácio vem
fazendo o mesmo que os poetas que recitavam nas praças públicas faziam: Inácio
vem afastando as pessoas da poesia. Vem trabalhando contra a divulgação da
poesia feita em nosso estado. Quem não tem intimidade com poesia jamais vai pegar
um livro depois de ver as barbaridades romanas no circo de Beto Carrero. E quem
já conhece poesia vai chegar em casa e abrir correndo um livro de Cecília
Meireles para matar a sede. Mantêm-se no séquito de Inácio os que já fazem
parte do séquito de Inácio. O séquito cresce, de fato, mas porque cada garoto
que integra uma antologia ou uma grade de apresentação numa feira do livro,
traz uma família com pelo menos cinco pessoas que não leem poesia. Leem o
parente.
O concorridíssimo Inácio estava ainda no Café
Literário na condição de entrevistador dos poetas Antonio Brasileiro e Mariana
Ianelli – isso depois de ter trocado de roupa, mais ou menos como a Beyoncé faz
em seus mega shows. Lá constatei outro problema. Já não havia mais a
deficiência da acústica e tampouco o problema de entrada e saída de pessoas,
afinal, havia senha para quem quisesse prestigiar o encontro entre escritores,
em um espaço fechado. Dessa vez o problema estava na inteligência do
entrevistador, que fazia perguntas do tipo: “Por que você escreve?”. E a
entrevista não caminhava. Antes claudicava. A outra pergunta era: “Quais os
autores que o influenciaram?”. A essa altura estava claro para mim que se
tratava de um quiz show e não de um encontro de escritores. Não
houve, em momento algum do Café Literário, uma discussão sobre Literatura, de
fato, sobre questões seminais da criação literária. Não houve qualquer
profundidade, uma dialética, uma conversa inteligente que pudesse instigar o
público. Desse modo a Bienal, no que concerne ao nosso estado, se torna um
ponto de encontro entre amigos e parentes dos escritores, interessados pela
pessoa no palco, e não pelo que o escritor tem a dizer. Há um desfile de misses
de vários municípios da Bahia e uma porção de famílias na torcida. Mas não há uma
Marta Rocha sequer no palco. Conclui-se facilmente que o problema, em verdade,
é apenas um: José Inácio Viera de Melo.
Se eu organizasse um café literário, sem
dúvida alguma convidaria o poeta alagoano José Inácio Vieira de Melo para se
apresentar, de um modo ou de outro. Porque, ainda que eu não goste da poesia
dele e não tenha uma relação amistosa com o centauro na casa dos quarenta anos,
não posso negar que o rapaz vem fazendo poesia com uma paixão primitiva. E
trabalha mais que um forçado, por sua poesia. Para cada poema uma arte visual,
uma produção incrível. Viaja o nordeste inteiro para ler poemas (!) e publica
um livro por ano, no mínimo. Divulga-se de um modo que jamais, agência alguma
de publicidade, conseguiria superar. É um trabalhador incansável. Tem diversos
poemas em tudo quanto é canto da cidade e não duvido que venha a ser o primeiro
poeta a divulgar seu blog em
Marte, quando a ciência criar possibilidades para isso. Não sou excludente e
desonesto, culturalmente. Não sou exemplo de nada, e todos sabem disso. Mas
levo poesia – e arte – muito a sério. E o fato é que é preciso mudar a imagem
da poesia baiana de hoje.
É preciso abrir as portas para a
qualidade e diversidade, e não para a quantidade. O que estou propondo é uma
forma de democracia alicerçada em critérios estabelecidos por um grupo de
pessoas mais ou menos ilustradas e cônscias do que seja poesia.
E peço que os poetas, baianos, que
concordam com o pensamento manifestado acima, entrem em contato comigo, a fim
de criarmos um grupo sólido de artistas da palavra que possam representar
melhor a poesia de nosso estado. A poesia baiana, de fato.
Quando li este artigo de
Henrique não conseguir pensar em outro nome que não o de Andy Warhol. E por
quê?! Para mim, ninguém é mais responsável pela auto-complacência e pela
vulgaridade daquilo que se chama Arte Contemporânea ao que Andy Warhol. Sua
capacidade de destruir as coisas não se limitou às artes plásticas nem a sua
pessoa, basta olhar a fortíssima influência que suas “idéias” em outros campos
artísticos. O Concretismo, por exemplo, nada mais é do que a versão Andy Warhol
para a poesia... a cagada é a mesma: arrancar da Arte, seja ela plástica ou
literária, a sua natureza mais íntima e essencial, substituindo-a por sua forma
mais banal e caricata. Mas Warhol está longe de ser superestimado, pelo menos
por mim, porque, desde os anos 60, não há exemplo melhor do que ele para
mostrar, a quem quiser enxergar, que não se deve subestimar o poder da
Idiotice... principalmente quando se dá razão a um idiota.
Para Andy Warhol, pessoas,
eventos e produtos dependiam unicamente da exposição contínua, principalmente
nos meios de comunicação de massa, assim, segundo ele, “existiam aos olhos do
público”, que não precisava entender de arte ou de estilo ou, muito menos, de
gosto, pois se estava o tempo todo na TV, por exemplo, é porque era bom, é
porque era artístico e ninguém questionaria tal coisa; desta forma, Warhol
formula a seguinte receita de sucesso, dividida em três partes:
Primeiro passo, usar um produto
comum, sem truque formal ou técnica apurada a desafiar a menor das
inteligências, dando a impressão de que a arte é algo frívolo, fácil e
acessível à inteligência mais mínima.
Segundo, depois fazer uso deste
produto em todos os meios de comunicação, principalmente quando estes
“trabalhos artísticos” já são, de certo modo, partes destes meios, expondo-os e
produzindo-os exaustivamente. Na era dos muitos reality shows e do YouTube isso faz mais do que sentido.
O que não faz nenhum sentido é
a arte, cuja função não é menor que tornar as coisas menos maçantes e dolorosas
ser reduzida num mero esboço daquilo que ela mesma, em sua essência e função,
torna maior e mais bela. Desta forma, incapaz de alcançar a arte pelo talento,
Warhol, como todo narcisista tomado de inveja e frustração, desdenha daquilo
que sempre desejou e tinha ciência de que jamais o obteria. Discípulo aplicado
das monices artísticas de Duchamp, a vida de Andy Warhol não se limitou a
retratar o mundo das celebridades, ele próprio foi a sua maior “criação
artística”, e nisso se encontrava o seu terceiro e último passo para a sua
receita malévola de destruição dos conceitos tradicionais e verdadeiros da
Arte, do Gosto e da Estética. Com o ar petulante e ridículo, análogo àqueles
coitados que, acabando de sair do Big
Brother Brasil, acreditam ter vencido o mais rigoroso dos rituais de
transcendência moral, filosófica e espiritual.
Numa época em que a produção
artística torna-se massificante, distribuída por mecanismos de produção em
massa, o que Zé Inácio faz, segundo o que nos mostra o autor deste artigo, é
copiar uma receita antiga que, há muito tem sido vendida a preço barato, porém
com ares de restaurante francês de novela das nove, mostrando o quão somos
subservientes a um tipo de vanguardismo sem sentido que há muito inunda nossos
meios de comunicação, livros didáticos, escolas e tutti quanti; onde a qualidade do que se apresenta é praticamente
nenhuma em relação ao como é apresentado. E o pior que pode acontecer a estes
garotos e garotas, que mal deixaram de cagar nas calças e já são apresentados
como cânones da Literatura Ocidental é acharem que realmente são o que lhes
dizem que são; daí para não quererem mais se aperfeiçoar e não ler nada mais
que seus próprios textos e os de seu “mestre de cerimônias” – o que já se
constituiria numa absoluta desgraça – é um pulo.
Citando, também, o Ortega y Gasset
– ais aí alguém que conhecia muito bem os perigos a valorização das idiotices –
pouco se pode esperar de alguém que só se esforça quando tem a certeza de vir a
ser recompensado, principalmente quando esta recompensa é uma autopromoção
também autoenganosa, que não se mostra com outra função que não seja o da
destruição de uma cultura verdadeira em troca de um engodo ao qual, se não
tomarmos cuidado, receberá este nome; como já podemos ver neste “samba do
crioulo doido” que se chama a política cultural brasileira; a cultura é o
sistema de ideias vivas que cada época possui. melhor: o sistema de ideias das quais o tempo vive; é
uma necessidade imprescindível de toda uma vida, é uma dimensão constitutiva da
existência humana, como as mãos são um atributo do homem, por isso o que o
Henrique faz ao criticar esta sistematização da bajulice é fazer aquilo que nos
recomendou o filósofo espanhol: “Em épocas de grande agitação o dever do
intelectual é manter-se calado, pois nessas ocasiões é preciso mentir e o
intelectual não tem esse direito”.
No final, o fim é sempre o
mesmo: “poetas” e “poetisas”, “novos” e “velhos”, “conhecidos” e
“re-desconhecidos” se amontoando na praça de Cordel da Bienal, em busca de seus
15 minutos de fama: “”, como In the
future, everyone will be famous for fifteen minutes diria o próprio Andy
Warhol, numa espécie de “Exercito de Reserva (Flutuante)” em quanto que seu
organizador, sem nenhuma gota de escrúpulo ou elegância, faz-se visto e
“amostrado” aos quatro cantos de um evento por ele mesmo produzido, pelo que me
parece... Saravá!!!
Feira
de Santana, 26 de abril de 2012.
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