terça-feira, 31 de agosto de 2010

UM DIÁLOGO COM PABLO NERUDA...


Eurótico de Gabriel Fereira, Betume da Judéia e carvão sobre tela (40x30 cm), 2007.





Desnuda eres tan simple como una de tus manos,
lisa, terrestre, mínima, redonda, transparente,
tienes líneas de luna, caminos de manzana,
desnuda eres delgada como el trigo desnudo.



Desnuda eres azul como la noche en Cuba,
tienes enredaderas y estrellas en el pelo,
desnuda eres enorme y amarilla
como el verano en una iglesia de oro.



Desnuda eres pequeña como una de tus uñas,
curva, sutil, rosada hasta que nace el día
y te metes en el subterráneo del mundo



como en un largo túnel de trajes y trabajos:
tu claridad se apaga, se viste, se deshoja
y otra vez vuelve a ser una mano desnuda.




* * *



Nua, és como os frutos contra o vento,

o contrair impuro de teus músculos,

como a transpiração das tuas flores,

vela chorando só em meio as preces...


És como um dispersar de velhas missas,

espaços partilhados pela ausência,

a sensação pesada, o Fogo Eterno,

és a falta, o princípio, o musgo, a fera...


Nua és como as frestas e as janelas,

as marcas de meus dentes em teu seio,

a certeza insensata das promessas...


És a busca e a descida a toda fonte,

o vento repetido em toda parte,

minha dor, minha paz e meu reflexo.


sexta-feira, 27 de agosto de 2010

DICA DE LEITURA: "AS HORAS DE KATHARINA" DE BRUNO TOLENTINO


O poeta Bruno Tolentino (1940-2007)





Após quase uma década esgotado nas prateleiras das livrarias e de um trabalho meticuloso de três anos, As horas de Katharina será finalmente relançado no dia 30 de julho, e desta vez com um brinde: a peça inédita A andorinha ou: a cilada de Deus, que Bruno Tolentino deixou pronta meses antes de sua morte, ao 66 anos. Com a introdução de Alcir Pécora, com o rigor de Juliana P. Perez nos comentários, com as notas de variação de Jessé de Almeida Primo e ficar hipnotizado com a capa de Cláudio Pastro. E, claro, aguardem em breve mais novidades sobre o lançamento. Juliana tem uma percepção muito aguda da obra de Bruno Tolentino, e nosso amigo Jessé, prestem bastante atenção, tem, segundo as palavras de Pedro Sette Câmara, e o meu próprio testemunho, o “melhor ouvido para poesia no Brasil. Segue um dos poemas do livro...

O ANJO ANUNCIADOR

— Ouve, Maria, a nossa
(não, não te assustes!) é uma luminosa
tarefa: retecer
o pequeno clarão que abandonaram,
o lume que anda oculto pela treva!
Porque irás conceber!
Porque a mão, desejosa
e tosca, que O tentara
reter, ainda que leve,
desfez-se ao toque, assim como uma vez
tocado o sopro se desfaz a avara,
a dura contração do peito ansiado...
Mas a haste, o jasmim despetalado,
é tudo o que ainda resta
dos canteiros do céu aqui na terra,
que um seco vento cresta
e uma longa agonia dilacera.
No entanto a morte há de morrer se tu quiseres,
ó gota concebida
bendita entre as mulheres
para que houvesse vida
outra vez, e nascesse desse fundo
obscuro do mundo,
o ninho incompreensível do teu ventre.

Não, não toques ainda
nem a fímbria do manto nem o centro
do mistério que anima a tua túnica:
aguarda, ó muito séria, a ave mansa
e recebe em teu corpo de criança
a Verônica única,
a enxurrada de pétalas te abrindo.

Em tumulto reunidas,
as cores da perdida Primavera
vão retornar, virão
numa enchente de asas, aluvião,
púrpura, sempre-viva, nascitura
estranheza do amor da criatura,
constelação descendo ao rosto teu:
é Ele, é O que reúne o coração
e o grande anel da esfera,
o fogo, a língua ardendo, o incêndio vivo,
a coluna de luz, o capitel que se perdeu...
Que eu

venho anunciar apenas a um esquivo,
humílimo veludo, a frágil chama
que há de crescer em ti, que hás de ser cama
ao parto do Perfeito, e hás de ser cântaro
e fonte e ânfora e água,
hás de ser lago
em que as sombras se afogam, que naufragam
no imenso, ó jovem branca como um lenço;
hás de conter a lágrima
do Infinito, o Seu vulto
e os tumultos da luz na travessia
entre a dádiva, a perda e a renúncia:
quando de um certo dia
cheio de luz amarga

em que serás enfim a sombra esguia
que O deu à luz e que O assistiu morrer...
Atravessa, ó Maria,
os abismos do ser,
ouve este estranho anúncio
e deixa-te invadir para colher,
mais fundo que a razão
e o corpo, o sopro cálido, o prenúncio
da mais viva alegria:
entreabre-te ao clarão
da visita suave,
mas terrível, terrível, deixa a ave
do imenso sacrifício te ofender.

Ó pétala intocada,
hás de sofrer
intensa madrugada
e num lago de luz como afogada
hás de durar suspensa
entre a graça imortal e a dor imensa.

Mas canta, canta agora
como a fonte borbulha, como a agulha
atravessa o bordado,
canta como essa luz pousa ao teu lado
e te penetra e tece a nova aurora,
a nova Primavera e a tessitura
do ramo que obedece e se oferece
para o mistério e pela criatura.

Canta a alucinação,
o toque enfim possível dessa mão
que há de colher para perder e ter
o infinito que nasce do deserto
e a semente que morre se socorre
tudo o que no estertor tentava ser.

Canta a canção do lírio e do alecrim,
essa canção que és e que na treva,
na escuridão da carne, andava perto
da imensidade que te invade. E assim
como o imenso te ampara,
ó voz tão clara
que consolas e elevas,
vem, desperta,
matriz da eternidade e d'O sem-fim,
ó mãe de Deus, canta e roga por mim


VOCÊ JÁ FOI A CAYMMI...?



No próximo dia 27, às 21hs na Casa da Música, Abaeté o gênio Dorival Caymmi será homenageado com um show intitulado “Você Já Foi A Caymmi?”.Com roteiro e direção de Ildásio Tavares, contando no elenco com a experiente cantora Márcia Short, que acaba de chegar de uma turné na Europa, Edu Nascimento, que responde pela direção musical, arranjos e violão, a percussonista internacional Mônica Millet, e no baixo acústico o talentoso Ângelo Santiago.

Este espetáculo faz uma varredura na obra de Caymmi, mostrando seus vários aspectos, desde as canções praieiras, músicas de base afro e os samba urbanos, revivendo no palco a grandeza deste gênio da música popular.

Projeto antigo do poeta Ildásio Tavares, foi idealizado para homenagear Dorival Caymmi, este que o poeta considera o melhor letrista da Música Popular Brasileira, e com quem mantinha uma relação de afeto e de grande admiração.Espaço da Fundação Cultural do Estado da Bahia, a Casa da Música vem-se notabilizando pela autenticidade de seus espetáculos que têm, inclusive, uma intenção didática, além do entretenimento com alto nível.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

SHOW DE LANÇAMENTO DOS LIVROS ABRUPTA SEDE E CLUBE DA HONRA









Na quinta-feira 26 de agosto, os escritores Emmanuel Mirdad e Aurélio Schommer estarão lançando o livro de contos e o premiado romance Clube da Honra. Até aí, tudo normal, mas para estes dois artesãos da incorreção e da polêmica, o ambiente engessado e tradicional de um lançamento de dia e em livraria seria incoerente com suas obras. Então, em vez de um mero boca-livre sem graça, acontecerá um Show de Lançamento, à noite (a partir das 22 horas), durante o evento “Night on Fire”, com o rock ao vivo das bandas traVoltA e Miss Blue, e as pickups do DJ Roots e DJ Pinguim.



Abrupta Sede reúne a melhor tradução do universo cosmopolita baiano do século XXI. São 25 contos densos em virtuose verborrágica, fluxo contínuo de emoções intensas e inesperadas, ácido, urbano, sexual e psicodélico, revelando um autor que faz jus à rica tradição literária local. É a estreia em livro de Emmanuel Mirdad, que é jornalista, produtor cultural, blogueiro e, sobretudo, observador do bicho humano aquém da superfície.



O chocante, original, irônico e devastador Clube da Honra, obra premiada pela Fundação Pedro Calmon, é o melhor romance de Aurélio Schommer (atual presidente da Câmara Bahiana do Livro), e é sobre a honra, mas também sobre a paixão, o desejo, a morte e os meios de obtê-la para quem está incomodando. Aurélio, que é roteirista e escritor de extensa trajetória (esta é sua sexta obra publicada), volta a provocar, pois em suas histórias não há mocinhos, só bandidos, alguns algozes e muitas vítimas.



O ambiente do Groove Bar, em parte underground, em parte elitista, não poderia ser mais apropriado a esses dois autores espinhentos e suas obras nauseantes; ambos são uma mescla entre o submundo, a transgressão, o desespero, e a sofisticação, o glamour e o sublime das melhores circunstâncias.



Os dois lançamentos saem pela editora baiana, o selo que mais cresce na Bahia nos últimos anos, e serão vendidos na noite por apenas R$ 30,00 (Abrupta Sede) e R$ 20,00 (Clube da Honra). Quem comprar algum ou os dois livros não pagará a entrada do evento.



Serviço



Show de lançamento dos livros Abrupta Sede (E.Mirdad) e Clube da Honra (A.Schommer)

Com traVoltA, Miss Blue, DJ Roots e DJ Pinguim



Quando: Quinta-feira, 26/08/2010, às 22h.



Onde: Groove Bar - Rua Marquês de Leão, 351, Barra.



Entrada: Homem R$ 25 / R$ 15 (até meia-noite na lista Orkut), Mulher R$ 15 (até meia noite é free na lista Orkut) - mas quem comprar algum ou ambos os livros não paga entrada.



Livros: R$ 30,00 (Abrupta Sede) / R$ 20,00 (Clube da Honra)



Info: (71) 3267-5124

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

11ª CAMINHADA DO FOLCLORE LEVA MANIFESTAÇÕES POPULARES ÀS RUAS - 29 DE AGOSTO DE 2010...





Repentistas, aboiadores, maculelê, capoeira, reisado, caretas, forró pé de serra e bumba meu boi. Estas e outras manifestações que expressam as raízes da cultura popular, vão emprestar um colorido especial às ruas da cidade, dia 29 de agosto, na 11ª Caminhada do Folclore. A iniciativa é da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), por meio do Centro Universitário de Cultura e Arte (Cuca), juntamente com o Sesc, TV Subaé e Prefeitura Municipal.


A proposta, segundo Selma Oliveira, diretora do Cuca, é realizar um desfile de grupos folclóricos que deverão mostrar diferentes aspectos dos traços culturais de Feira de Santana e de outros municípios da Bahia. “Enfim, o que pretendemos é resgatar, preservar, divulgar e valorizar as nossas tradições populares”, destaca. Ela acrescenta que o evento é único na Bahia com esse perfil.


Até agora mais de 100 grupos, dos quais 48 de Feira de Santana e distritos estão inscritos para participar da Caminhada. São 53 grupos de outras cidades baianas, a exemplo de Alagoinhas, Santo Estevão, Tanquinho, Pedrão, Santo Amaro, Salvador, Antonio Cardoso, Anguera, Água Fria, Serra Preta, Conceição do Jacuipe, Irará, Santa Bárbara, Teodoro Sampaio, Barrocas, Araci e Ipirá “Mas as inscrições ainda estão abertas para grupos de outros municípios e continuamos a receber solicitações de muitos interessados, o que pressupõe que o número de inscritos ainda pode crescer bastante”, afirma Tânia Augusta Pereira, idealizadora e coordenadora do evento.

A Caminhada do Folclore está inserida no Guia de Bens Culturais do Brasil e marca o encerramento das comemorações alusivas à Semana do Folclore. Nesta edição serão homenageados dois grupos que sempre prestigiaram a iniciativa: Lagoa da Camisa, de Feira de Santana e Cara Pintada, de Lustosa, distrito de Teodoro Sampaio. “Essa é a maneira que encontramos para retribuir àqueles que contribuem para a realização de evento tão significativo”, observa Tânia Augusta.


A organização dos grupos começa às 8h, enquanto o desfile está programado para as 9h, saindo da Avenida Getúlio Vargas, em frente ao bar 14 BIS, com encerramento na Praça de Alimentação.


A Caminhada conta com o apoio cultural da Faculdade Nobre (FAN), Colégios Nobre, Santo Antonio e Helyos, Escolas Despertar e João Paulo I. Também apóiam o evento o Corpo de Bombeiros de Feira de Santana, Fundação Cultural Egberto Tavares Costa, Juizado da Infância e Adolescência, Delegacia do Menor Infrator, Conselho Tutelar, Policia Militar e 35º Batalhão de Infantaria.



Feira de Santana, 09 de agosto de 2010.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

UM SONETO PARA MIHAI EMINESCU...


Lúcifer por Mihaly Zichy (1887).




LÚCIFER
SOBRE UM POEMA DE MIHAI EMINESCU
POR SILVÉRIO DUQUE




à Cristina Nicoleta Mănescu, por sua história.













Sobrou de toda mágoa – e destas ânsias –
este anjo cujos olhos renasciam
entre os vôos que, nas asas, se insurgiam
por entre os céus sem fim e sem distâncias.

Ele girou em torno de seu rosto
num estertor de infinito que o nutria,
e, na manhã reescrita que o seguia,
vi a rosácea inconsútil de um sol-posto.

O anjo, de asas de sombra e luz que medra,
deixou seu nome em tudo quanto existe,
por ser, entre as estrelas, a mais triste.

Tudo que o anjo quis, perdeu na queda...
O ardor pelo que morre e o rosto terno
de alguém que se cansou de amar o Eterno.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

UM POEMA DE MIHAI EMINESCU...


O poeta romeno Mihai Eminescu (1850-1889)



VARIAÇÕES SOBRE UM POEMA DE MIHAI EMINESCU:

SOMNOROASE PASARELE

tradução de Silvério Duque











Somnoroase pãsãrele
Pe la cuiburi se adunã,
Se ascund în rãmurele -
Noapte bunã!

Doar izvoarele suspinã,
Pe când codrul negru tace;
Dorm si florile-n grãdinã -
Dormi în pace!

Trece lebeda pe ape
între trestii sã se culce -
Fie-ti ângerii aproape,
Somnul dulce!

Peste-a noptii feerie
Se ridicã mândra lunã,
Totu-i vis si armonie -
Noapte bunã!














I

Sonolentos passarinhos

vêm pousar por sobre os galhos,

vão dormir entre os seus ninhos...

Boa noite!



Só uma fonte, ao longe, ecoa;

no silêncio deste bosque,

flores dormem à garoa...

Dorme em paz!





Vai um cisne, sobre as águas,

repousar em meio ao juncos –

levem os anjos suas mágoas...

Sono doce!





E o calar da noite erguia

uma linda e clara lua:

tudo é sonho e harmonia...

Boa noite!











II



Mortos de sono, os passarinhos

vêm repousar por sobre os galhos

e, exaustos, volvem aos seus ninhos...

Irão dormir!





Somente a fonte, ao longe, fala;

mas, no silêncio destas matas,

dorme uma flor e tudo cala...

Que durma em paz!





Um cisne passa sobre as águas,

vai descansar em meio aos juncos –

que os anjos lavem as suas mágoas...

Um sono doce!





E, à meia-noite, há a alegria

de uma esquecida e alta lua,

pois tudo é sonho e harmonia...

Boa noite!

Ambas as "traduções" foram uma sugestão de meu amigo

Elpídio Mário Dantas Fonseca,

que, muito condescendentemente, também me deu o seu aval.