sábado, 14 de março de 2009

GREGÓRIO ALLEGRI (1582-1652): MESERERE MEI, DEUS...


Gregório Allegri (1582-1652),

Quatro vozes se distribuem em uma melodia graciosa, as mais graves parecem se prenderem ao chão, como que prostradas ao solo, enquanto que as vozes médias, seguindo a mesma melodia das demais, elevam-se um pouco, como quem necessita olhar para cima, buscar algo além... de repente, a terceira voz parece vacilar, mas é arrebatada pelas outras vozes superiores, que parecem pairar sobre as vozes mais graves e, quando tudo parece desmoronar, todas recitam, em uníssono, um salmo de clamor e adoração e retornam à mesma melodia, até que uma voz agudíssima desliza, elevada, pelo ar, acima de todas as vozes, como se fosse o próprio propósito das demais, enfim, conquistado, e, levíssima, abençoa àquelas que ainda não alcançaram tamanho grau de santificação e as conduz a persistir, fazendo-as crer que, se ali ela chegou, todas, assim, o podem. É dessa maneira que eu imagino o Miserere mei, Deus..., (Salmo 51: Miserere mei, Deus: secundum magnam misericordiam tuam...) de Gregório Allegri (1582-1652), desde a primeira vez que o escutei, como se fora "a própria musicalização da Graça"; como se todo o sentido do Cristianismo se resumisse numa melodia, se nos fosse dado ouvir o Espírito Santo cantar. Nascido na Itália, Allegri foi um modesto cantor e compositor da Igreja do Santo Espírito, em Roma, quando Urbano VIII era o Sumo Pontífice e, não temendo compor uma música antiquada para os padrões do seissentismo, onde se alteram um dulcíssimo canto para quatro solistas, com uma voz superior que deveria alcançar notas agudíssimas, em toda, uma raridade para este tempo, Allegri logo conseguiu que sua composição se tornasse de uso exclusivo da Capela Papal. A partitura original nunca fora publicada e, com o tempo, o registro escrito se perdeu sobre a ameaça de quem o editasse sofrer severos castigos. Até, é claro, a Semana Santa de 1770, quando Leopold Mozart e seu filho Wolfgang, com apenas 14 anos, foram à Basílica de São Pedro para escutar, como era de costume de anos, o coro e o enigmático Miserere mei, Deus... Arrebatado pela forma grandiosa de sua melodia, o pequeno Mozart, usado de sua tão lendária memória musical o copiou, de uma só audição, e nos legou a notação desta que é uma das mais elevadas composições já feitas pelo homem... O ruim desta história é que a fama de Gregório Allegri, a mais de 200 anos, se dá muito mais pela façanha do jovem Wolfgang Amadeus Mozart do que pela qualidade de seu Misere... A composição de Gregório Allegri, sobre o Salmo Bíblico, é cantada todas as Sextas-Feiras Santas, na Capela Cistina, desde 1668, ano em que fora escrita. Se quiserem escutá-la, por favor, acessem: http://www.youtube.com/watch?v=yDRoL7ziDP4



PSALMO LI


Miserere mei, Deus: secundum magnam misericordiam tuam.
Et secundum multitudinem miserationum tuarum, dele iniquitatem meam.
Amplius lava me ab iniquitate mea: et a peccato meo munda me.
Quoniam iniquitatem meam ego cognosco: et peccatum meum contra me est semper.
Tibi soli peccavi, et malum coram te feci: ut iustificeris in sermonibus tuis, et vincas cum iudicaris.
Ecce enim in inquitatibus conceptus sum: et in peccatis concepit me mater mea.
Ecce enim veritatem dilexisti: incerta et occulta sapientiae tuae manifestasti mihi.
Asperges me, Domine, hyssopo, et mundabor: lavabis me, et super nivem dealbabor.
Auditui meo dabis gaudium et laetitiam: et exsultabunt ossa humiliata.
Averte faciem tuam a peccatis meis: et omnes iniquitates meas dele.
Cor mundum crea in me, Deus: et spiritum rectum innova in visceribus meis.
Ne proiicias me a facie tua: et spiritum sanctum tuum ne auferas a me.
Redde mihi laetitiam salutaris tui: et spiritu principali confirma me.
Docebo iniquos vias tuas: et impii ad te convertentur.
Libera me de sanguinibus, Deus, Deus salutis meae: et exsultabit lingua mea iustitiam tuam.
Domine, labia mea aperies: et os meum annuntiabit laudem tuam.
Quoniam si voluisses sacrificium, dedissem utique: holocaustis non delectaberis.
Sacrificium Deo spiritus contribulatus: cor contritum, et humiliatum, Deus, non despicies.
Benigne fac, Domine, in bona voluntate tua Sion: ut aedificentur muri Ierusalem.
Tunc acceptabis sacrificium iustitiae, oblationes, et holocausta: tunc imponent super altare tuum vitulos.

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